domingo, 28 de fevereiro de 2016

Inscrições nos discos dos Smiths: the tatty truth


Certa vez, me deparei com uma foto de um vinil do single How Soon Is Now dos Smiths com uma descrição que dizia The Tatty Truth. Fiquei intrigado com essa descrição. Ao procurar pelo significado dessa expressão, acabei fazendo uma das descobertas mais incríveis relacionada aos Smiths e ao Morrissey: as gravuras ou inscrições que podem ser encontradas em vários dos vinis não só dos Smiths, mas também da carreira solo do Morrissey.

Vinil do single How Soon Is Now (Referência 1) 

Isso mesmo, para aqueles que ainda não sabem, sendo pegos de surpresa assim como eu, diversos dos vinis dos Smiths e do Morrissey possuem frases gravadas na própria matriz do vinil, com significados diversos. No single How Soon is Now, a inscrição que pode ser encontrada no vinil é exatamente The Tatty Truth, algo como a verdade barata, em português. Na realidade, tatty pode ser traduzido também como vulgar ou mesmo surrado.

Simon Goddard, em seu livro dedicado às canções dos Smiths Songs That Saved Your Life, se refere a essas gravuras como hieróglifos em que os apóstolos de Morrissey e companhia poderiam se deleitar ao segurar o vinil com ambas as mãos contra a luz e olhar atentamente para a área em que termina os seus sulcos, ou grooves (APPENDIX I do referido livro).

Na figura abaixo, pode-se observar a inscrição encontrada em outro single dos Smiths, Ask, com a música Cemetry Gates como lado B. A inscrição gravada no vinil desse single é Tomb It May Concern. Acredito que essa frase seja uma expressão em inglês derivada da expressão To Whom It May Concern que significa "a quem possa interessar". Tomb It May Concern significaria algo como "a tumba pode interessar".  
   


Lado B do single Ask com sua inscrição Tomb It May Concern (Referência 2)

Confesso que nunca me interessei em comprar algum vinil dos Smiths. Prefiro poupar uma grana para investir em outras coisas. Mas, depois que fiz essa descoberta, fiquei um pouco tencionado a comprar quem sabe algum que vir por aí. Apesar de nunca ter comprado nenhum vinil, encontrei um do Strangeways Here We Come largado na casa de um tio meu e o tomei para mim. Infelizmente, esse vinil ficou guardado na casa dos meus pais milhares de quilômetros longe de onde eu moro, de modo que não pude ainda verificar se esse tipo de inscrição está presente nele. Lamentavelmente, acho que isso é pouco provável, pois é preciso ressaltar que apenas os discos lançados no Reino Unido os possui.

Uma lista completa com todas as inscrições pode ser vista no link abaixo (vale a pena dar uma conferida):
http://www.geocities.ws/costelt/Lyrics/etching.htm


Johnny Marr de graça em São Paulo (Festival da Cultura Inglesa 2015)

Foi com uma imensa surpresa que em um dia comum eu descobri que haveria um show do Johnny Marr em São Paulo. Maior ainda foi a minha surpresa ao saber que o show seria de graça por fazer parte do Festival da Cultura Inglesa 2015. Estando em Curitiba e tendo perdido o show do Marr no ano anterior no Lollapalooza, me programei rapidamente para ir a São Paulo e tratar de não perder essa grande chance.

A viagem de ônibus foi bem tranquila. Cheguei no sábado a tempo de por o papo em dia com o meu primo, conhecer a Avenida Paulista e tomar algumas beras na Augusta. Algumas não, foram várias. Um copo atrás do outro e quando não esperava por nada mais além de uma bela noite de sono, uma parada num bar na Consolação para tomar mais algumas no balcão, enquanto alguns bêbados demonstravam toda a animação da bebedeira da noite em um karaokê localizado nos fundos.

Chego em casa e me deito. Acordo pela manhã logo cedo com a cabeça a rodar e um mal-estar horrível. Corro pro banheiro e ponho para fora o que comi no bar da Consolação. Preciso de água, mas tomo um pouco de chá verde que acho na geladeira. Alguns minutos depois, ponho o chá verde pra fora. Não teve jeito, tive que sair e comprar um engov para ter mais disposição para ir pro show. Funcionou maravilhosamente bem.

Saí de casa com a intenção de chegar mais ou menos uma hora e meia antes do show do Marr e foi isso que aconteceu. Quando Cheguei na estação da barra funda, a movimentação para o Festival era evidente. Havia várias pessoas com a camisa dos Smiths e gente com a camisa do evento para orientar as pessoas que chegavam para ir ao Memorial da América Latina. Já no memorial, pude me dar conta de onde eu estava. Lugar maravilhoso, desenhado pelas mãos de Oscar Niemeyer, arquiteto de maior expressão do nosso país. O memorial, cujo projeto cultural aliás foi feito por Darcy Ribeiro, outro grande nome da expressão cultural do nosso país, era o plano de fundo perfeito para o guitarrista do norte da Inglaterra associado de certa forma a movimentos populares. E lá estava eu com o palco ao fundo do lado da famosa esculta de concreto da mão com o mapa da américa latina vermelho com o que seria sangue a escorrer, uma clara referência ao Veias Abertas da América Latina do Eduardo Galeano. Vergonhosamente, reconheço que ainda não li esse livro. Mas em breve lerei O Povo Brasileiro do Darcy e em seguida, "veias abertas" virá com tudo. Espero escrever algo sobre esses livros no futuro.

 

Monumento do Niemeyer inspirado no livro As veias Abertas da América Latina

Quando cheguei no Festival, a banda The Strypes estava finalizando o show. Aproveitei a movimentação do pessoal após o fim do show dos caras para me aproximar do palco, acompanhar o show da Gaby Amarantos e ansiosamente esperar pelo show do Marr. Bem, o show da Gaby Amarantos merece algumas notas. Não tenho nada contra a Gaby e o tipo de música que ela produz, o problema é que ela arriscou cantar algumas músicas dos Smiths sem sequer saber a letra completa! Eu estava bem próximo do palco, para ser mais exato, bem em frente às caixas de som do lado direito. Deu até pra ver que a Gaby estava olhando, junto com as suas convidadas, para o que seria uma tela no chão do palco, provavelmente lendo as letras e ainda assim se perdendo em vários momentos. O que falar da performance de Heaven Knows? Acho que ela poderia ter se esforçado um pouco mais na preparação para cantar Smiths. Ficou devendo um pouco.


Foto do local do Festival. Dá pra ver a  mãozinha do Memorial no canto esquerdo da imagem 

O show da Gaby acabou e eis que depois de certo tempo surge o grande astro da noite. O show do Marr começou com Playland, bela música, mas que não está na minha lista de músicas favoritas da sua carreira solo. A minha emoção foi a mil mesmo quando ele começou a segunda música da noite: panic. Em panic, eu pude perceber que eu estava tendo naquela noite a oportunidade de presenciar uma performance musicalmente muito próxima do que era os Smiths. Na realidade, com as próximas músicas dos Smiths que ele tocou, arrisco-me até mesmo a dizer que a performance do Marr e sua banda musicalmente falando é ainda melhor do que várias das performances dos Smiths ao vivo. Esse foi o grande destaque daquela noite. Foi algo que verdadeiramente me surpreendeu, pois as performances pós-Smiths das bandas recrutadas pelo Morrissey que eu já tinha visto e ouvido não passam de covers perto da performance do Marr naquela noite. Sobram as críticas de sempre de que o Marr não serve para cantar, algo que eu discordo e que aquele show pôde me mostrar isso claramente. 

Johnny Marr com sua Fender Jaguar no Festival da Cultura Inglesa
O show continuou com várias músicas do Marr, das quais destaco New Town Velocity, Easy Money e The Messenger. New Town era uma música muito esperada por mim por ter um clip com muitas referências arquitetônicas em uma espécie de psicogeografia em Manchester. As outras, obviamente, eram esperadas por estarem entre as mais conhecidas dele.


New Town Velocity em uma das tomadas destacando um pouco da arquitetura de Manchester 

O momento mais emocionante do show, como era de se esperar, foi reservado para There's a Light That Never Goes Out. O público cantou boa parte da música junto com ele. Senti que definitivamente até mesmo quem não fazia ideia de que o Johnny tinha agora uma carreira solo estava cantando. Foi mesmo um momento mágico.

There's a Light poderia ter sido a última música do show, mas isso já tinha sido feito no ano passado no Lollapalooza. No Festival da Cultura Inglesa, sobraram mais quatro músicas: Stop me if You Think You've Heard This One Before, Upstairs, o belo cover de I Feel You do Depeche Mode e fechando com chave de ouro, a icônica How Soon Is Now. Foi com How Soon Is Now, maravilhosamente tocada por Marr e sua banda, que aquele show incrível foi finalizado.

Na saída do Memorial, pessoas com camisas dos Smiths iam embora mais do que felizes. Tive tempo de procurar por alguns fãs dos Smiths que havia conhecido no facebook e acabei me encontrando com um deles. Tiramos fotos e registramos o momento. Voltei para Curitiba no mesmo dia com uma vontade louca de registrar aquele grande show e torcendo para que eu tenha alguma outra oportunidade de estar presente em um show do Marr. Não custa cruzar os dedos.


Setlist do show:

Playland
Panic
The Right Thing Right
Easy Money
25 Hours
New Town Velocity
The Headmaster Ritual
Back in the Box
The Messenger
Generate! Generate!
Bigmouth Strikes Again
Candidate
Getting Away with It
There Is a Light That Never Goes Out
Stop Me If You Think You've Heard This One Before
Upstarts
I Feel You
How Soon Is Now?