sábado, 21 de maio de 2016

O concreto aparente como sinal de modernidade: brutalismo no Brasil

Assim que vi o projeto de modernização do Mineirão para a copa do mundo de 2014, fiquei pasmo com o fato de que a sua fachada e boa parte externa do teto seriam mantidas. Sempre achei aquela estrutura crua enorme com o concreto aparente em praticamente toda a sua extensão de um mal gosto tremendo. Ficava me perguntando: mas por que manter essa estrutura tão antiquada quando os países mais desenvolvidos caminham no sentido oposto, "modernizando" a estrutura externa dos seus estádios?

Talvez o maior exemplo disso é o projeto de remodelação do grandioso estádio de Wembley, em Londres. Nem mesmo as famosas Twin Towers (torres em branco na imagem do Wembley antes da reforma; figura abaixo), restaram após a demolição do antigo estádio. Fato é que o novo Wembley ficou incrivelmente belo após a sua reconstrução, porém a sua arquitetura foi brutalmente remodelada.

Wembley antes (acima) e depois (abaixo) da sua reconstrução iniciada em 2000  (referência 1)
Compreendi apenas há alguns meses o porquê do Mineirão permanecer com uma fachada praticamente igual a de antes da reforma. Para mim, como amante do futebol, o Mineirão representa o principal exemplo da chamada arquitetura brutalista.

Mineirão: na minha opinião, maior exemplo do brutalismo no Brasil (referência 2)

O brutalismo é um movimento arquitetônico que surgiu e se desenvolveu nas décadas que se sucederam à segunda guerra mundial. A guerra trouxe consigo a necessidade de projetos rápidos e baratos de reconstrução das áreas afetadas, algo que o brutalismo pôde proporcionar com o concreto aparente em suas construções, não havendo a necessidade de acabamentos específicos.

A origem do brutalismo é associada ao arquiteto sueco Hans Asplund, quando este utilizou o termo "novo brutalismo" (do sueco nybrutalism) para descrever uma casa construída em 1949 em Uppsala e foi adotado em 1954 pelo arquiteto inglês Reyner Banham para se referir a diversas obras daquela época em seu livro intitulado The New Brutalism: Ethic or Aesthetic? 

Apesar das referências a esses arquitetos, o marco inicial do brutalismo, trazendo algumas das principais características das obras desse movimento, é a chamada Unidade de Habitação (Unité d'Habitation) de Marselha, projetada pelo reconhecido arquiteto e urbanista Le Corbusier. As Unidades de Habitação fizeram parte de um programa de reconstrução do governo francês após a Segunda Guerra Mundial.
Unité d'Habitation de Marselha: o marco inicial do Brutalismo (referência 3).

Outra grande obra de Le Corbusier com características do movimento brutalista é o prédio da Assembleia Legislativa da Índia em Chandigah. A construção desse e de outros prédios tão representativos quanto no mesmo país foi realizada por Le Corbusier em um ambicioso plano diretor que, ao que parece, possuía um intuito que se assemelha ao que foi posto em prática em Brasília.

Prédio da Assembleia da Índia em duas perspectivas distintas (referência 4).
O movimento brutalista no Brasil foi adotado por diversos arquitetos e os traços desse movimento podem ser visto em inúmeras construções de norte a sul do país. Além do já citado Mineirão, projetado por Eduardo Mendes Guimarães Júnior e Gaspar Garreto, outros prédios podem e devem ser citados como grandes exemplos da arquitetura brutalista. Um deles é o estádio do Morumbi, desenhado pelo renomado arquiteto brasileiro Vilanova Artigas. É também de Vilanova Artigas o projeto de Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP-São Paulo.

    
Estádio do Morumbi (referência 5)
Prédio da FAU USP - São Paulo vista de fora e parte interna: belo exemplo do brutalismo de Vilanovas Artigas (referência 6)
Ainda em São Paulo, o MASP (Museu de Arte de São Paulo Assis Chateubriand) também traz os traços brutalistas na sua estrutura. Na figura abaixo (foto antiga do museu projetado por Lina Bo Bardi sem a tinta vermelha em suas pilastras), isso fica bastante claro. 

O MASP brutalista (referência 7)
Apesar dos prédios acima citados serem mais conhecidos, na minha opinião, um dos prédios mais interessantes de São Paulo, e que por isso eu não poderia deixar de mostrar, com traços brutalistas é o do SESC Pompeia.

SESC Pompeia em duas perspectivas (referência 8).
Quando se trata de brutalismo, a cidade do Rio de Janeiro não fica nem um pouco atrás de São Paulo. Duas belíssimas obras desse movimento chamam a atenção de qualquer pessoa que passe nos seus arredores. A primeira é o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM). O MAM foi projetado por Affondo Reidy e está muito bem localizado no Parque do Flamengo próximo ao aeroporto Santos Dumont. O museu se integra perfeitamente à beleza do local, como pode ser visto na tomada aérea na segunda figura abaixo.  



    
MAM-RJ visto de ângulos e locais variados (referência 9).
Para fechar com chave se ouro, a mais bela construção do brutalismo no Brasil, na minha opinião, é claro, é a Cidade das Artes no Rio de Janeiro. Cidade das Artes é um complexo cultural projetado pelo arquiteto e urbanista francês Christian de Portzamparc e inaugurado, após uma série de polêmicas associadas ao seu custo e execução, no início de 2013. O projeto conta com diversas salas de aula, ensaios, cinema e teatro, além de uma sala de música de câmara, restaurante, cafeteria e lojas.

Tive a oportunidade de ver pessoalmente o prédio da Cidade das Artes numa das minhas visitas ao Rio de Janeiro. Na ocasião, eu estava no BRT me dirigindo até a praia da Barra da Tijuca, numa tarde de domingo. Ao chegar próximo ao terminal Alvorada, ponto final do BRT, vi aquele prédio imponente, com traços modernos e arredondados, vãos enormes (algo que lembra um pouco os trabalhos de Oscar Niemeyer) e baseado todo em concreto aparente. Não fazia ideia do que seria aquele prédio até fazer uma pesquisa depois. Não cheguei a encontrar nenhum texto sobre o brutalismo no Brasil que trouxesse essa construção como um de seus principais expoentes. Abaixo, pode-se ver algumas fotos dessa belíssima construção. Essas fotos nos mostram como o concreto aparente pode ser tão bem explorado e como o brutalismo na sua essência ainda está presente em projetos arquitetônicos contemporâneos.








Cidade das Artes em toda a sua beleza (referências variadas no google imagens).



REFERÊNCIAS:

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